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Entrevista com Mariana Bastos e Valentina Herszage - "Raquel 1:1"

O Mulheres no Horror teve a honra de conversar sobre o filme Raquel 1:1 com Mariana Bastos, diretora do longa, e Valentina Herszage, a protagonista da obra. A diretora e a atriz compartilharam conosco sobre o processo de criação da obra, o impacto da personagem Raquel em tantas outras mulheres e a importância de tratar de questões pertinentes como a violência contra a mulher em meio ao contexto social brasileiro.


Raquel 1:1 foi o único filme brasileiro no South by Southwest (SXSW) 2022, um dos maiores festivais de cinema, música e tecnologia do mundo, e fez parte do 37o Festival Internacional de Guadalajara, no México, como um dos longas que representaram o Brasil na Competição Oficial de Longas-Metragens Ibero-Americanos. No último ano, a produção também esteve presente em festivais de Portugal, Alemanha, Itália e outros países. No dia 23 de março, o filme fez a sua estreia nos cinemas brasileiros, com distribuição da O2 Play.


O filme narra a história da jovem Raquel, que ao chegar a uma pequena cidade do interior, vive acontecimentos misteriosos e embarca numa controversa missão ligada à Bíblia e a traumas de seu passado. Valentina Herszage, vencedora do prêmio de melhor interpretação Bisatto d'Oro, no Festival de Veneza, protagoniza o filme, ao lado de Emílio de Mello, Eduarda Samara, Ravel Andrade e Priscila Bittencourt.


Em entrevista ao Mulheres no Horror, Mariana e Valentina falam sobre o início do processo de criação do filme, suas interpretações e reflexos na audiência, a intrínseca relação entre o Horror e o feminino, dentre outros assuntos. Confira a seguir a entrevista na íntegra.




Vocês poderiam contar pra gente um pouco sobre como foi o início do processo de criação do filme “Raquel 1:1”?



Mariana: Queríamos construir uma história que envolvesse religião, mas ainda não tínhamos tão claro o que poderia sair daí. Comecei a fazer pesquisas e mergulhar em universos de diversas religiões e entendemos que seria interessante abordar a que mais crescia no Brasil, que era a evangélica. Quando comecei a pesquisar sobre a Bíblia, me deparei com a forma que as mulheres eram retratadas nos textos, o que inclusive já era algo problematizado também em espaços religiosos. Isso foi o ponto de partida para o que acabou vindo depois, que era propor uma reflexão sobre a violência contra a mulher a partir dessa perspectiva.


Valentina: Eu entrei no filme mais ou menos em setembro de 2019. A Mariana e a Ana Luisa, produtora de elenco, mandaram uma cena pedindo para eu improvisar em um vídeo. Eu já tinha gostado muito da ideia e assistido a filmes da Mariana, então me empenhei muito no teste. Quando passei, eu e Mari começamos a nos encontrar e conversar sobre a personagem.





“Raquel 1:1” é um filme que começou a ser concebido há quase 10 anos atrás, e desde então nós, mulheres, conseguimos conquistar importantes avanços do movimento feminista, mas também passamos por diversos momentos de ameaças aos nossos direitos fundamentais, além da crescente onda de fanatismo religioso ligado muitas vezes à práticas misóginas. Vocês sentem que, depois destes anos de acontecimentos marcantes para as mulheres, sobretudo no Brasil, o filme adquiriu novos significados e interpretações?



Mariana: Acho que o filme ganhou mais espaços porque assistimos em tempos recentes uma escalada do pensamento conservador, radical. Quando criamos o roteiro isso estava um pouco menos intenso com relação à religião em si. Ou talvez a gente não tivesse ainda a percepção tão clara desse crescimento. Mas a verdade é que a violência contra a mulher no Brasil é um problema grave e antigo e, ao mesmo tempo, sempre fomos um país muito religioso, o que é uma contradição. Então o filme de certa forma era atual tanto numa época quanto na outra.


Valentina: Com certeza! Saímos agora de um governo super autoritário e repressor. Acho que nessa virada, na qual o país está voltando a respirar depois de uma pandemia, é muito interessante que a gente possa continuar discutindo questões feministas e relacionadas a intolerância religiosa. Só assim iremos avançar. Foi nos dada uma oportunidade e as discussões devem crescer cada vez mais, e não retroceder.





Para Mari, como você se sente ao ter criado uma personagem que representa a realidade e os desejos de tantas outras mulheres; e para Valentina, como você se sente ao ter dado vida a essa personagem tão impactante?



Mariana: Acho que a vontade de transformar o mundo é algo que muita gente carrega. É algo que essa personagem traz dentro de si, a partir de dores e violências que já sofreu. Gosto que a personagem gere identificação, acho que isso acaba sendo um fator importante para que as pessoas gostem dela e se envolvam de forma mais profunda com a história. Saber que o desejo dela ali é semelhante ao de quem está assistindo o filme faz com que o espectador torça mais pra ela alcançar o que busca.


Valentina: A Raquel foi um presente para mim. Gosto muito de personagens misteriosos e enigmáticos, que carregam traumas. Nem sempre você consegue explicar o que um personagem está sentindo. Acho que esse é um roteiro perfeito para esse tipo de condução da narrativa dramática do personagem. Eu aprendi muito! Não sou ligada a nenhuma religião, mas pude estudar profundamente e entender mais o Brasil onde vivemos, com tantas religiões diferentes. Foi um trabalho muito especial.





O Horror aparece no Cinema constantemente atrelado à questões religiosas e também possui uma relação intrínseca com o feminino, podendo ser uma poderosa ferramenta para discutir questões sociais relevantes. Como vocês acreditam que os elementos de Horror contribuem para potencializar a mensagem que o filme transmite?



Mariana: Acho que o terror, como um gênero que se baseia no medo para criar suas histórias, tem muito a contribuir em relação a diversos temas. Essa é uma emoção, um sentimento, que nenhum ser humano está livre. Muitos dos nossos medos surgem da forma como vivemos, nos relacionamos, das dificuldades que enfrentamos, do que não conhecemos. Pode ser uma experiência solitária ou derivada do convívio em sociedade. Nesse filme, o medo deriva da violência. O horror é pautado pelo feminicídio. Nós conhecemos muito bem o que é ter medo da violência, assim como conhecemos muitas outras formas de medo dentro de nós.


Valentina: O horror ajuda a escancarar questões que podem ser consideradas horrorosas mesmo - como um horror social, psicológico. E o que a gente mais vive hoje em dia é esse horror do feminicídio, das agressões, violências e abusos. Acho que isso tudo é bem conectado à palavra do horror mesmo. “Raquel 1:1” escancara questões que temos dentro de nós. Até mesmo em nós, mulheres, que também temos heranças machistas. O filme conversa com o gênero e com a questão atual.





Por último, mas não menos importante: vocês poderiam mandar um recado para todes que acompanham o Mulheres no Horror e irão assistir “Raquel 1:1” nos cinemas?



Mariana: Agradeço muito por abrirem espaço para que esse assunto seja uma pauta por aqui e desejo uma excelente sessão para quem vai ao cinema ver o filme. “Raquel 1:1” é um filme sensorial, que ganha muito na experiência do espectador quando visto na tela grande, com som de qualidade, no escuro e com uma pipoca na mão. Faz toda a diferença.


Valentina: Mulheres no Horror, eu convido vocês a assistirem “Raquel 1:1” nos cinemas para poderem ser atravessadas por essa discussão. Eu, Mari e os produtores adoramos quando as pessoas nos trazem discussões, e o cinema está aí para isso. Então aproveitem e depois nos digam o que acharam!


 

Raquel 1:1 já está nos cinemas! Confira as sessões disponíveis aqui.



Trailer do Filme:




Cena Exclusiva:



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O Mulheres no Horror é um espaço de troca de informação, onde  compartilhando artigos e resenhas sobre livros e filmes, publicamos dicas sobre a temática, contamos a histórias de mulheres e pessoas queer que fazem parte do cinema e literatura de Horror, realizamos traduções de textos, entrevistas com pesquisadoras e cineastas, dentre outros conteúdos.

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